quarta-feira, 27 de abril de 2011

Pode ser a gota d'água?

Novidades... a cada alvorada. Deixar que os pensamentos transbordem para dar lugar à serenidade de tentar.

Um espanto, um suspiro, e outra angústia que se desfaz. Não sofro de noites passadas: manifestam apenas a ruptura com enganos fatídicos, quando desvelados, não retornam como promessa de repetição. Levanto outra todos os dias, renovo os ares como o outono renova o verde primaveril. Assim como o dinamismo das estações destroem o antigo para dar lugar ao novo resplandescente, movimento minhas ideias e meus passos em direção ao porvir. Entretanto, nem sempre tal impulso de descostrução/construção se mantém no espaço que a ele é concedido.

Naturalmente é comum ultrapassar espaços. Nem sempre tal invasão é intencional, ao contrário, pode até mesmo intentar a demonstração da grandeza de um sentimento. Porém, tal pretensão ingênua pode vir a desmoronar outros propósitos. A natureza nem sempre cabe numa bola, levando-a a expressar sua força desmedida, violenta, quando não suporta mais ser o que não é. A natureza é grande. Dentro de nós também está presente esse cataclismo natural: impulsos, sensações, desejos que querem imprimir a sua força no mundo, mas são tolhidos pelo dever civilizado de não "invadir" a liberdade alheia, não sucumbir o indivíduo que somos para si e para o outro... Pois bem, meu caro leitor, a proposta de se renovar às vezes foge ao nosso "controle". Mesmo intuindo criar novas perspectivas, se esbarra nas anteriores, nas cercanias da distância necessária mas invadida pelos deslizamentos não intencionais. Entretanto, quando se evidencia que escolhemos um local inapropriado para construir a morada de ser, não devemos insistir em lutar contra a fatalidade provável: deslizamentos são comuns em áreas cujo solo é instável e poroso. 

 Não é com atropelos torrenciais - mesmo que poéticos, mesmo em sua graça e ingenuidade -  que se mantém o elo com os afetos que se encontram na terceira margem... Não é com a força que a natureza demonstra serenidade diante as transformações que sofre. Paradoxalmente, também não é com a força que demonstra a força que possui para mudar: ocorre no tempo que passa e constroí desconstruíndo...

Deveras, manter cercanias como coadjuvantes de qualquer renovar nos assegura notar um espaço em que o curso das mudanças propostas devem respeitar. Não deve ser um desmoronamento de emoções, tampouco construções duvidosas sobre terrenos erosivos ou dunas que permanecem sobre a tutela do curso do vento. Não é transbordando soluções que o tempo reconstrói vazios, lacunas, aresta deixadas em outras eras. Nem é esboçando paisagens pitorescas que convencemos o espectador da maestria alcançada em orquestrar nossas paixões. Entretanto, certamente a beleza é notória e reconhecida pelo espectador quando o protagonista abandona a intenção de se adornar com imagens agradáveis e atua na superfície de tentar ser....possível. Porvir. 

  

domingo, 24 de abril de 2011

Vontade, menino.

Ah, que vontade que tenho de ligar, de se perder em um milhão de palavras que significam no fundo apenas uma e incomensurável coisa: amo você. Mas não posso. Ainda não. Ah, que vontade de olhar dentro dos seus olhos cor de outono e fazer-me tua, como na primeira vez... Mas não é a hora. Ah, que vontade de abraçar-lhe deixando-lhe chorar como um menino, afagando-lhe as bochechas e dizendo que mesmo machucado, podemos brincar e fazer arte juntos. Mas não sei se acreditará que pode mesmo jogar comigo. 

Ah, que vontade de amar e a amar cada virtude, cada defeito, cada silêncio seu, cada palavra de afeto. Mas agora, preciso ficar só. Ah, menino de coração ansioso, que vontade de acordar ao seu lado como Mulher que descubro que sou. Mas ainda é cedo e o dia não clareou. Se eu pudesse, correria agora mesmo em sua direção, gritaria teu nome só para você ouvir-me num sussurro, numa só nota musical. Mas agora não é o momento de improvisar melodias. Ah, menino, como eu queria lhe presentear com um jogo de futebol rubro negro só para vê-lo vibrar e torcer pela vitória (nossa?).

Ah, como suspiro a cada alvorada uma nova vida, como tenho vontade de dividir essa alegria que sinto com a mesma alegria de outrora que encontrei ao seu lado, mas preciso recuperar o fôlego para não afogar nas espumas do mar depois de tanto esforço em passar pela arrebentação das ondas... Ah, menino, que vontade louca e renovada de estar ao seu lado e lhe ver sorrir, lhe ver chorar, lhe ver dormindo como menino, encolhido na cama. Ah, se eu pudesse, inventaria um jeito de chegar perto de ti sem que me notasse, só para te proteger do frio, fazer cafuné enquanto tenta dormir, contar piadas quando tivesse triste, pra garantir que cada dia seria tudo novo de novo. Mas ainda estou aprendendo comigo mesma como posso compartilhar a pessoa maravilhosa que sou sem querer ser a mulher ideal que sonhou...

Ah, como eu queria saber se você ainda sente aquele friozinho na barriga quando demonstro o carinho e afeto que tenho por ti, como eu queria ouvi-lo dizer que sabe muito bem que a forma que tenho neste momento para mostrar-me a ti sem que me veja é desenhando palavras. Como eu queria que entendesse que só me esforço em manter um elo de afeto, que não quero criar situações desconfortáveis, tampouco parênteses entre tantas colocações difíceis de digerir... Mas não posso falar quando tu me lês... Quanta vontade, menino, de carregar seu amor em meu peito, de ser uma parte gostosa de sua vida, de lhe dar vontade de sorrir quando me vê passar. Mas tudo que posso é esperar e ocupar o espaço vazio que deixou com novas perspectivas, mesmo que não venha me buscar... 

Ah, menino... Teu coração ansioso dispara ainda em minha direção? Quantas perguntas e mais perguntas eu queria que respondesse, mas é melhor acreditar que no fundo tem um pedacinho de mim no seu peito que pulsa forte, que lhe dá vontade e mais vontade de saber o que é isso que chamamos de amor. Quanta vontade de ouvir sua voz suspirando em meu ouvido, chamando pelo meu nome e dizendo que sente saudades, que ainda dorme do "meu lado" da cama só pra sentir-se mais pertinho de mim. Ah, menino, queria  vê-lo descendo a rua, parando na porta da minha casa, esperando que eu abra o portão e ouça com atenção a minha música favorita, que sempre deixa tocar quando eu chego. Ah, menino, queria que não tivesse pressa de partir nunca mais ... Mas agora é hora de recolhimento, de ficar quietinha esperando a chuva passar.

Queres ainda andar de mãos dadas na praça? Tomar sorvete domingo à tarde, vendo filme na tv? Queres fazer outro macarrão (pois sabe que adoro) só para me agradar e me ver saborear taças de vinho? Queres me levar no alto do Ibituruna pra ver o pôr do sol? Queres se agarrar a chance de refazermos cada história? Como eu queria saber se minha intuição acerta quando me leva a acreditar que um amor cativo fortalece ao invés de esmorecer após passar por turbulências, mas é preciso dar espaço para que não nos tornemos dependentes do que passou... E pousar no que pode ser amanhã.

Como queria ter domingos e mais domingos contigo... Mas agora precisamos reformar a semana.
Como tenho vontade de ama-lo desse jeitinho que você é. Mas não quero atropelar nenhuma hora que seja necessária para tentar reconstruir nossa casa. 
Como eu queria...
Quanta vontade, menino... 

sábado, 23 de abril de 2011

O que queres encontrar?
Olhe nos meus olhos e diga
O que queres encontrar?
Quero ser de verdade
Gente de carne e osso
que só peca quando desiste de tentar
atentar (se),
quando não entende que o amor
muda tudo
de dentro
e de fora.
É, Mulher.
Descestes da Ideia
e tornastes humana.
Agora é permitido a ti
sentir dor
gozar num dia frio
amar sua silhueta
sem apagar uma curva.
É, Mulher.
Aprendestes a olhar pra dentro
Sem culpar (se)
E achar que deves ser a
vontade do mundo.
Tu és sua agora.
Você te pertence,
Mulher.
E representa em tua arte
de recolhimento
o que tu queres de si
e de quem estiveres repousando
em tua cama.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Aurora

Expirar...
Saber adiar vírgulas
para desanuviar enganos.
Estar segura
sentir-se pronta para
confiar no jogo
sem trapaças
ou atropelos acidentais.

Depois do engano
desvelado falsas impressões
depois de encarar as horas
que desperdicei mudando
os móveis errados de lugar,
depois de encarar as horas
que desperdicei convencendo-me
que eu podia mudar o mundo
sendo que o mundo (meu)
permanecia inerte,
Eu vi.
Eu soube.
Eu entendi.
Mudar dentro de mim
é mudar o mundo
que amo
e compartilho.

Separar
também é rever como encarar
as mudanças e o dinamismo de valores
em questão.
Amores
em discussão
e não no funeral.
O luto se foi...
Segunda feira passada
meu calendário passou a contar os dias
por mim.
Passou a angústia.
A dor.
A falsa expectativa.
A vontade de perfeição.
E happy end hollywoodiano.
Sou carne,
admito e perdoo tropeços.
Meus.

Agora,
e daqui em diante,
Meu corpo se expõe, nu, em carne viva,
aos ventos ardis do porvir
venha,
amanhecer divino que encerra um ciclo
de frustrações.
Agora,
contemplo de pé
a aurora
que sou.
            
                                          

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Don't go

Sou Eu
sendo eu
no verbo
transitivo
direto
e
indireto.
Com os pés descalços
unhas pintadas
cabelos curtos
e batom vermelho.

Por eu - um jogo
um A(s)
Eu ou não-eu
é a questão
Percalço o primeiro caminho
no espelho
sou eu
sendo eu
Engrandeço minha
energia de Eu
para um dia
poder haver nó(s)
   por dois
   Eus
(im)pares.

O falo

Escrevo por impulso.
Sim, Clarice.
Preciso deixar que essa Mulher fale.
Eu. 
Não silencio mais a minha voz.
Sou versos livres
soltos na imaginação
de quem lê minha pele
Voo fora da asa de todos
e de ninguém.

Porque meu nome 
não se pronuncia se não for 
Eu.
É mais bonito assim.
Sim, Manoel.
E livre de qualquer compromisso
com idealismos sem romance
nem sei porque são ideais se são frouxos de amor.

Sabe,
vivo uma emoção que se soltou
da garrafa.
Como champagne
Espumando
borbulhando
fazendo cócegas no nariz
provocando risos e mais risos
em mim.

Falo.
Se escuta-me...
Não deixo de falar
Mulher.

domingo, 17 de abril de 2011

Lolita

Deixei-me mostrar pela metade.
É, eu sei, mulheres são tolas
Permanecem na fantasia erótica do outro
mesmo depois de experimentar
ser Mulher.
O que ele queria era a Mulher
Era EU.

E fechei a cortina...
Fechei a cortina para fazer mistério,
Ele não entendeu que era pra entrar
e tomar-me sua.
Ele não viu nada além de minha silhueta.
Era pra ser espontâneo
o que foi teatral.
Eu quis fazer amor,
Mas você estava só a me olhar pela cortina.
como se não pudesse mais me tocar
Ele me velou
ele me admirava
sorria e trazia chocolates
Mas não me tocava como Mulher.
Fui sua menina
Ele me protegeu de si mesmo
E eu só queria
Ser a Mulher...

Permiti que mexesse em mim
e me visse entre um balançar e outro
de uma brisa que soprava pela janela,
Mas não tocou-me.
Não atravessou a cortina
Sua mão deslizou pelo meu corpo,
Mas não o reconheceu maduro
De Mulher.
Ele via Lolita.
Queria a Mulher.
Mas fugia da Mulher
Pra se acomodar na insegurança
de Lolita
Sem porto.

Dormi.
Estava exausta
Lamentei não ter ido pra cama com ele,
assim, como sou
além da cortina
Mulher.

Quando acordei,
era noite,
chovia,
não havia luz elétrica.
vesti uma camisa velha que estava pendurada na porta
E ele havia ido embora.
Sem me conhecer.

Me aproximei da janela,
ascendi um cigarro,
Ele me viu
Sem nada que turvasse a visão
Mas estava longe...
Permaneci ali,
parada, desejando tudo sem pedir nada
em troca.
Ele só via Lolita
E queria a Mulher.

Deu-me um sorriso menino
Aquele de quem nunca viu
uma mulher nua
Mas ele se virou, atravessou a rua
E partiu sem saber
que meu nome era EU
A Mulher.

Ele só via Lolita.

Dança das cadeiras

"No jogo do amor vale tudo." Será que vale mesmo?

Acho que essa assertiva é um tanto perigosa. Por exemplo, em uma relação, todos almejam um amor incondicional. Entretanto, vejo um problema sério na definição de "incondicional". Se considerarmos, sem maiores especulações, incondicional é, ao "pé da letra", obviamente, "sem qualquer condição ou condicionamento". Não acho que seja assim, pois vejo que amar o outro implica uma condição a priori: desapego. E está condicionado à seguinte prerrogativa: o amor não reside em nenhum coração que pulse pelo sangue dos outros, que está do lado de fora do próprio corpo.

Permita-me ir um pouco mais longe. O ato de amar começa em nós mesmos. Quando nos amamos, driblamos a solidão e experimentamos uma felicidade que não é clandestina, porque brota como uma água que é da própria fonte. Amar a si mesmo já é viver o amor, isto é, a benfazeja do amor e da felicidade não depende de um outro que preencha o vazio de não amar. Esse vazio é provocado pela ausência de nós mesmos, pela falta de amar a si como amaria qualquer outra pessoa - o que torna a solidão um "problema". Quando sentimos falta de alguém, na realidade, é a falta que nós mesmos nos faz... Nesse sentido, o outro não preenche este "vazio de eu", mas acrescenta e compartilha o ser feliz de cada um. Se responsabilizamos o outro pela nossa tristeza, é porque não admitimos que a tristeza é um miasma que se desenvolve pela auto insatisfação... O outro é só um escopo, onde apontamos uma causa culpada para não encararmos que nós mesmos somos responsáveis pela dor que nos aflige... É neste momento que a solidão torna-se um problema, que a falta consome nosso ânimo e desprendemos todos nossos pensamentos e emoções para fora de nós ao invés de volta-los para quem somos - tornamo-nos ressentidos e culpados por não sermos quem o outro esperava que nós fôssemos, esquecendo-se que tal ressentimento é gerado por não admitirmos com toda expressão e força quem somos. 

Deveras, depois que beijamos o príncipe encantado ele vira sapo.

Amar alguém não é mímese, é dinamismo. Não é um monólogo de uma personificação unidimensional: não há um Deus Ex Machina que amarra todas as pontas pra dar vasão à expectativa criada pela narrativa... A construção complexa de um amor a dois não afere a renúncia de ser "eu" para enaltecer a felicidade do outro; uma relação a dois não tem primeiro e segundo lugar, todos são primeiros em valor e importância, não há concessão de privilégios a um "mais fragilizado" em detrimento do outro "mais forte": pois somos força e fraqueza ao mesmo tempo. É a compreensão e não a primazia de um sobre o outro que garante a potência do elo... Colocar o outro num cargo de chefia da relação somente confunde amor com trabalho, rotina, cumprimento de metas idealizadas e inatingíveis: é isso que gera o desgaste, a apatia, a sensação de uma "felicidade infeliz"; o outro torna-se "seu dependente" ao invés de companheiro. A "parceria" se esgota, a intimidade desaparece (relação entre "funcionários da mesma empresa" não são admissíveis em boa parte das instituições...) e o amor torna-se frustração, desejo inacabado, ausência. E tudo pode começar com a ausência de manter a autonomia de ser o que tu és...

Voltemos à questão que levantou minha curiosidade: no amor vale tudo? Sim!

Valer tudo permeia valer dois amores próprios que se enlaçam na mesma teia... É valer-se de si em tudo. 

E tenho dito: amar-se como o és faz qualquer um capaz de amar quem o outro é. Não é narcisismo se amar, é narcisismo achar que a perfeição alcançou sua forma plena em seu reflexo no espelho...O que passou, desapeguemos depois de testar os próprio limites, sem entretanto perder a delicadeza de se renovar em outra chance. Os desacertos de outrora não há como apagar, porém, é uma oportunidade para criar resistência para uma nova partida, uma nova rodada: o último romance sempre é uma novidade posterior. O amor já vivido nos traz de volta ao porto seguro que reside no em si de cada um. 

Minha saudade é autoreferencial...

Sem faltas...

E quando o outro chegar...

  


domingo, 10 de abril de 2011

O ilusionista.


Recomeçar? Sim!!

Sendo humanos, deslizamos. Nos confundimos e as vezes criamos uma situação esquizofrênica, por só existir em nossa mente. É tão fácil nos iludir... Basta um gesto, uma palavra mal interpretada para imaginarmos uma situação com vida própria: persongens, passado, presente e futuro (futuro?! Sim, leitor, futuro, é possível?!). Nessas horas, somos ilusionistas por conveniência, nos dotamos do poder da adivinhação sobre o porvir que na realidade não passa de meras conjecturas vazias, advindas da confusão entre realidade e ilusão, causada por nossa própria imaginação...É verdade, leitor, nossa mente pode também ser uma atração ilusória que transforma lenços em pombos...

Nós, mulheres, sabemos muito bem  o perigo que as ilusões representam: temos a habilidade inata de pensar em inúmeras possibilidades de significação para um sorriso amarelo, uma piscadela sem direção, um olhar enigmático... Talvez seja por isso que fazemos, por vezes, o uso - as vezes exagerado, confesso - da palavra em busca de uma confirmação ou negação de nossos devaneios hormonais... Palavra, pra nós, pode ser o Gato de Botas que aparece sem se mostrar, trazendo à tona a intepretação verdadeira de nossos desejos no País das Maravilhas...

Entretanto, se iludir não é privilégio do sexo frágil - aliás, a fragilidade feminina, meu caro, não é pejorativa. É força criativa que nos impulsiona a tentar e resistir à comodidade da conformação. Somos fisiologicamente mudança -. Indiferente ao gênero, todos podem ser vítimas de pensamentos delirantes que por vezes nos convencem de sua veracidade: basta apenas ceder à tentação desprazerosa de tais ideias. Não sabemos de onde vem, se porventura existe mesmo um gênio maligno responsável pela introjeção de conjecturas malucas e sensivelmente irracionais, perversas por provocar o sofrimento e o engano - se existir, deve se divertir  horrores ao nos sacanear... Ou se nós mesmos nos colocamos em um test drive tecido por nossas "impressões desencantadas" que nos choca contra o muro, insistindo que ele não existe. Ao invés de duvidar, simplesmente acreditamos em nossa ilusória criação: como um truque de mágica, em que sabemos que é um truque, mas nos maravilhamos ao avesso (neste caso) com a fantasia.

No entanto, viver não é tirar todo dia um coelho da cartola...

É pretencioso e ingênuo de nossa parte admitir a frustração como um ponto final. A frustração nos coloca em uma posição defensiva, por sentirmos uma necessidade colossal de reavaliar nossos pensamentos e atitudes em busca de uma conciliação interna (entre desejo e realização) e externa (entre acertos e equívocos). Quando experienciamos tal desventura, nos sentimos como o Homem de Lata, sem coração, vazio de amor... Como se todos os nossos fluídos corporais evaporassem em segundos, entre querer ficar e saber que o melhor é se afastar por um tempo: entrar na cabine e desaparecer por segundos, dixando claro que está ali,  e logo há de retornar refeito. Entretanto, se nos rendermos à desventura, aos infortúnios do passado que não irão se apagar; se nos rendermos à sensação de fracasso e a baixa estima que  paira como um nevoeiro  que turva todas as qualidades e dias felizes em jogo, aí sim fracassaremos ad infinitum. Não é sensato nos privar da coragem de recomeçar, de investir em novos jogos de linguagem quando temos ainda uma pequena chance. Não é sensato nos perdermos em uma teia tecida por nossas ilusões só por puro receio autoconservador de um coração partido...

Viver entre as teias que tecemos o significado de nossa vida é indubitavelmente um desafio. Mas eu já libertei a mosca da garrafa, em busca de tecer outra fortuna ao amor que deveras sinto. Agarro-me com alegria à pequena chance, aos primeiros fios renovados que brotam vagarosamente em minhas mãos... Estou nua à beira de um amor cativado, aguardando apenas um sinal para me atirar...

















sexta-feira, 8 de abril de 2011

Eu te amo.



Não, não acho mesmo que temos medo de amar.

Temos medo de falar de amor. Sendo a palavra uma imagem que representa nosso ser invisível, aquele que se reserva às esferas mais subterrâneas de ser, falar de amor talvez seja uma exposição intolerável do que somos: nada mais que amor em potência. Queremos amar, mas sob um véu, que ao mesmo tempo em que revela o desconhecido, vela sua inteireza: só mostramos uma parte do eu que nos garanta que permaneceremos inteiros, ilesos, intocáveis. Agora me responda, leitor: há como permanecer intocável, inteiro, ileso ao amar? 

Criamos um universo cosmológico para dotar tudo que nos cerca de um sentido, de um significado -   é  a fórmula que efetuamos para colocar o invisível na superfície dos olhos, tornando-o "aparente"... A imagem que criamos de nós mesmos também postula o que significamos para o mundo, para o outro. Entretanto, esquecemos que imagens são como máscaras teatrais que ocultam a persona para mostrar o personagem. Ou seja: estas imagens, como as máscaras, se moldam de acordo com quem somos ou quem queremos ser - o que nos supõe a beleza de sempre poder mudar, sem necessariamente nos perdermos no caos das possibilidades....

No entanto, o desejo de amar que nos consome na mesma medida que nos alimenta nos faz uma ressalva. Amar exige que estejamos dispostos a romper com o pacto de segurança que a máscara e o véu nos oferece. É neste momento que entra a palavra. Pois só a palavra pode dizer o indizível que permeia a imagem e muitas vezes confunde o coração. Falar é preciso. Amar exige que nossa carne seja exposta ao vento. Tais reflexões (ou desvarios meus) me fazem lembrar de uma canção do Chico Buarque e Tom Jobim que tem o mesmo nome deste post e a qual faço referência agora:

"Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora,
Me conta agora como hei de partir??
Se ao te conhecer,
Dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz, pra onde é que 'inda posso ir??
Se nós, nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz, com que pernas eu devo seguir??
Se entornastes a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça de teu coração,
Meu sangue errou de veia e se perdeu??
Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E meu sapato 'inda pisa no teu??
Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios 'inda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair??
Não, acho que estás te fazendo de tonta
te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta: como hei de partir??"

Amar envolve mais que imagem: é o ato reflexionante de imaginar... Imaginar envolve tanto a imagem quanto a palavra, num exercício contínuo e doloroso de se descobrir em dois. A dois. É confundir as pernas sem deixar de caminhar em sintonia, compartilhando individualidades. Não é epiléptico. Amar é dialético. Sempre negar o que foi pra dar passagem ao que pode ser. É um constante tentar, descobrir a dois possibilidades, medos e desejos... E desejar... E amar. É atirar-se num abismo sedutor, numa simpatia antipatizante que nos atrai, nos convida a "pular de cabeça" em águas desconhecidas. 

Deveras, amar é "para além" de um verbo... 

Porém, é enunciando EU TE AMO que difundo publicamente a imagem de nosso futuro a dois. Atado em nós. 



(Foto: todos os créditos a Caspar David Friedrich por sua pintura "O viajante diante do mar de nuvens", de 1818) 





domingo, 3 de abril de 2011

Mostro-me (?!)

Ou ou. Tem sempre que haver reticências entre o visto e o não visto.

Trata-se de um desvelamento que ao mesmo tempo oculta tanta coisa... É um querer atingir o Ser que sempre escapa entre os dedos, como água corrente no rio. Mostro-me. Ficção? Aparência? A interpretação do espectador se dissolve na novidade que acrescento em mim a cada dia: um amor, um novo pensamento, uma nova poesia. Um constante renovar e re-interpretar. Sempre fazendo de mim uma obra de artista. 

Não quero Ser, quero Sendo: um projeto arquitetônico e pictório que se permite construir e desconstruir, fazer subir a poeira da demolição para criar uma beleza nova e finita. Entre ficção e aparência, não há apenas um jeito de me ver e vislumbrar a fragilidade e força que faz de mim uma Mulher. A menina afogada cresceu e tornou-se Mulher. Sendo Mulher, sendo Afrodite, sendo Vênus alicerço minha nova casa, cheia de espelhos, com portas e janelas abertas para que a Mulher não seja mais vista no escuro...

Entre dias púmbleos e primaveris, as reticências... Onde encontro-me outra vez, sendo hoje um porvir. Me des-cubro. Nua.