sábado, 7 de janeiro de 2017

Jardins

Gustav Klimt - A árvore da vida, 1909.

Pensei que fosse tarde
para permitir que um sentimento
tão intenso desabrochasse.
Já havia estabelecido a fronteira
entre razão e sensibilidade,
o território estava bem protegido
pela conquista de sensações as quais
durante muito tempo,
acreditei que seriam encontradas 
apenas do lado de fora.
Como pude ser tão tola
em acreditar que a felicidade 
e o amor habitariam outras moradas
que não fossem às do meu próprio ser?!
Como pude interpretar tão equivocadamente
os sinais vitais que meu próprio corpo emitia?!
Antes de refazer o meu jardim
com as mais belas formas de mim mesma,
compreendia que o amor e a felicidade, 
feito a floração de uma bromélia,
são ansiosamente aguardados
embora nem sempre aconteça. 
Variáveis como o clima, a terra,
o cuidado no plantio,
podem condicionar a possibilidade 
de ser presenteado ou não com tamanha beleza.
A flor de uma bromélia representa 
a expressividade do que ela é. 
Ora, como hei de buscar minha expressividade
num jardim que não é meu?!
Como hei de encontrar sensações que não são,
antes de tudo, semeadas dentro de mim?!

Nem o amor, tampouco a felicidade
podem ser colhidos se não forem plantados
bem aqui, no único lugar em que posso
senti-los: onde pulsa o meu sangue e meus versos.
Meu corpo, minha morada, meu jardim.
Onde deveras posso contemplar 
o nascimento e a morte das estações.
Por querer amar semeio o amor
dentro de mim;
por querer ser feliz semeio a felicidade
dentro de mim.
Assim como a beleza das bromélias
não são guardadas para a exclusividade
do meu olhar sobre elas,
o meu amor e a minha felicidade,
não se reduzem a serem cativados dentro de mim.
Podem ser partilhados em todos os momentos,
em tudo que faço e posso germinar mais amor.
Assim como uma bromélia sente a flor dentro de si,
sinto o amor e a felicidade dentro de mim,
florescendo a todo instante. 

Hoje esses sentimentos refazem
as fronteiras que antes determinei
numa fórmula tão pragmática, 
permitindo a plasticidade em detrimento
da rigidez, isto é, permitindo que esses sentimentos
transitem entre o meu jardim e o jardim de outrem.
Entre eu e você, que faz florescer em mim
a mais bela das flores sazonais. 
Daí o amor e a felicidade se tornam presença,
mas não é a presença de um visitante o qual,
após a estadia, retorna ao seu lugar de origem,
de quem hei de sentir uma imensa sensação de vazio
em virtude da falta que me faz.
Assim como tempo, amor e felicidade
se tornaram a minha matéria.
Mesmo sem você, um jardineiro inesperado,
o amor não deixa de ser cultivado
cotidianamente, preparando-se para florescer
até nas circunstâncias mais inadequadas.
Mesmo sem você, um jardineiro inesperado,
que já semeou em mim a mais singela de todas
as sementes que já pude germinar,
o amor há de florescer mesmo quando for tarde...




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