sábado, 10 de dezembro de 2011

O que queremos senão... amar?!

As vezes não percebemos o que pode ser importante; ou percebemos e não nos damos conta, impedidos por um véu que obtusa a visão teimosa em enxergar apenas o que é agradável. Detestamos nos sentir incomodados, temos resistência em nos sentir provocados, em perceber que tecemos fantasias o tempo todo as quais, ao serem desfeitas, nos tira do eixo, nos obriga a mudar de trajetória. 

Entretanto, sempre estamos recomeçando: partindo de um lugar para outro, criando outras ideias, revendo convicções antigas e por vezes rasteiras, remanejando a vida que nem sempre é aprazível. Recomeçamos a todo momento, sem exceção. Porém, preferimos acreditar que vencemos o devir  - que nos carrega nos braços feito criança ingênua que não sabe andar pelas próprias pernas - com planos estabilizadores. Mas o devir se movimenta conduzindo a vida como uma maré que ergue as forças para se desmanchar na praia...
Sim, assumimos compromissos que na realidade ocultam um compromisso que não queremos assumir: tudo muda, tudo acaba e recomeça, tudo é construído e destruído simultaneamente. Nada permanece o mesmo, mesmo quando tudo parecer ser a mesma coisa, deste jeitinho repetitivo e, obviamente acomodado. De fato, isto é desnorteador, pois nos coloca frente a frente com o vazio, a falta de sei lá o que consumidora de dias e noites fugazes. E, quando menos esperamos.... passou. O que devia ficar, se foi.  

Todavia, criamos mitos, estórias, ideais para preencher este vazio que parece se ampliar em vez de se sucumbir - temos "tudo" mas somos invadido pela sensação de não ter nada, e ficamos inseguros entre tantas figuras estabilizadoras que tão logo nos desencantam. Está aí, ou melhor, está aqui dentro, pulsando, pulsando, pulsando... Deveras, este vazio se alarga e quanto mais tentamos eliminá-lo, mais afirma sua presença inelutável. Agora eu te pergunto, leitor: como podemos amar qualquer coisa sabendo que fatalmente há de se acabar? Como amar o que vemos e o que sentimos quando a névoa que nos apresenta o que queremos ver se dissipa diante de nossos olhos?

Eis uma perspectiva que apresento como resposta para artistas: telos em branco, vida pulsada em tinta e aguarrás. 

Quando do Nietzsche concebeu o Amor Fati, preconizou um amor pela vida sem excluir as vicissitudes que a compõem. Portanto, não se trata de apenas encher os pulmões e dizer: "Sim! Eu amo a vida!" quando experimentamos um estado de felicidade, o qual é apaziguador. Não. Se trata de encontrar este mesmo estado de felicidade quando o vazio que nos habita também nos lembra de nossa efemeridade, nossa finitude e nossa impermanência - ainda que vivos - na vida do outro; se trata de não amar apenas o resumo da ópera, ou as "boas" explicações situacionais ofertadas pelo deus ex machina - amemos toda a trágica composição!

O amor (Fati) não é aquilo que apetece o corpo e cabe dentro da lacuna que o vazio incansavelmente estende dentro de nós. É o que mais nos incomoda, que nos leva para a margem do abismo que nos habita e nos impulsiona a saltar. Ao mesmo tempo, nos movimenta até retornar à superfície onde nos convida a dançar, a sorrir, a querer viver mais e mais, sem no entanto mudar - num sentido de elevar para um "Melhor" inalcançável, uma promessa stendhaliana - simplesmente querer ser o que tu és, dentro da vida que tu tens.

Amar a vida, amar alguém abarca este estado de perplexidade que é desassossego. Comoção, cria-ação do novo de novo, de novo, de novo... Ad infinitun...
Amor que é quietude, é beato.
Afirmação inerte é paliativo.
Felicidade estrangeira sempre perde o trem.
Tudo está aqui (dentro), o amor (Fati) não habita outro lugar.  

AML

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